sexta-feira, 4 de setembro de 2009

ALMAS LUSITANAS #3 - MÃO MORTA, CLUBE DOS POETAS MORTOS BRACARENSES - Pt.1



É tão difícil escrever sobre os Mão Morta, quanto mais tentar dissertar sobre eles. De facto, poucas bandas nacionais conseguiram elevar tanto as letras, misturadas com um som eclético, urbano e industrial, num contexto romântico oitocentista, transposto para o fim de século XX e para lá dele.
Muito do culto que existe em volta dos Mão Morta deve-se ao estrondoso poder de Adolfo Luxúria Canibal transmitir os pensamentos. Para podermos ter uma ideia, ele junta a transmissão de pensamentos filosóficos de Maynard James Keenan, com o negrume de Nick Cave e ainda um poder de dramatização como Peter Gabriel.
Mas não é só nas palavras que reside a força dos Mão Morta, é na música. Um sexteto composto por três guitarras e uma baixista bem conceituada, e um baterista dotado.
As raízes dos Mão Morta estendem-se até ao fim do Estado Novo e da Guerra Colonial, com o regresso dos retornados do Ultramar. A família de Adolfo era uma delas, de facto, ele nasceu em Angola. cedo veio para Portugal, onde se sediou em Braga, que eram as origens da sua família. Em 79 veio estudar para Lisboa, cidade onde se formou em Direito pela Universidade do Descontentamento, altura Faculdade de Direito de Lisboa. Cidade esta que demarcaria e bem a personalidade de Adolfo, como um cenário sujo, com o casal ventoso ou lado. Cernários urbanos que Adolfo nas suas viagens haveria de narrar tão bem no brilhante álbum dos Mutantes S. 21.
Reza a lenda que foi no baixo que já nem faz parte da banda que tudo começou. Joaquim Pinto surgiu com Harry Crosby juntamente com o baixista dos Swans, durante um concerto da banda em Berlim, que se virou para ele e disse-lhe «Tens cara de baixista». Esta motivação inseperada levou-o, juntamente com Mugel Pedro e o nosso amigo Adolfo a fundar os Mão Morta.
Adolfo recrutou ainda o seu amigo Zé dos Eclipses, colega dos Bang-Bang e AuAuFeioMau. foi em 12 de Janeiro de 1985 que os Mão morta se estrearam a tocar no Porto. Na altura Miguel Pedro passou para a bateria com a entrada de Zé dos Eclipses. Desde logo se notava a diferença dos Mão Morta. Não pela força vocal de Adolfo, mas pelo poder da sua narrativa, e da maneira como os sons levavam e criavam o ambiente sonoro das história.
Já por altura do concerto no Rock rendez-Vous se dera a entrada de Carlos fortes, 2º guitarrista e recebiam prémio de originalidade da extinta casa de espectáculos. O culto crescia já nesta altura, até porque nunca foram banda para grandes projecções.
O primeiro álbum só sairia em 1987 pela editora de João Peste dos Pop dell'Arte, Ama Romanta. Nesse mesmo ano actuariam com Nick Cave & the Bad Seeds, que os deixaria aos últimos bastante impressionados com o potencial do rock romântico negro dos bracarenses. O primeiro álbum verdeiramente emblemático seria, contudo, Corações Felpudos. Dava logo para ver a miscelânea que eram os Mão Morta. Tanto um hard rock agressivo, como Fado emborrachado de caixão à Cova, tão combalido quanto hilariante. Mas os Mão Morta eram malta para criatividade virtualmente sem limites. O.D. Rainha do Rock & Crawl (OD de overdose) foi álbum que pelas circusntâncias em que nasceu deixar-se-ia esbater na discograifa da banda, até à vinda do emblemático Mutantes S.21. Este disco é um dos mais apreciados pela audiência. Mostrou também a tendência dos bracarenses por álbuns conceptuais. em cada música, o narrador visitava uma cidade, e Adolfo conseguia, quase que como um Eça de Queiroz contemporâneo descrever espaços e pessoas com detalhe e vividez. Lisboa era o tema de abertura. E a decandência de um império era visível, as falhas de uma cidade corrompida, até à vida boémia (se bem que todo o álbum é vida boémia e auto-destrutiva) em Amsterdão (Have Big fun) e nas famosas noites de Budapeste, até Paris e Berlim. Esta é sem dúvida um álbum incontornável na carreira dos Mão Morta.

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