quinta-feira, 6 de setembro de 2012

DIABO NA CRUZ - ROQUE POPULAR (2012, MURMÚRIO)

Quando apareceram em 2009, os Diabo na Cruz (que sempre foi um projecto de vida do então já sólido cantor a solo Jorge Cruz), representaram uma autêntica lufada de ar fresco na cena musical portuguesa.
Quando questionado sobre o seu projecto, Jorge Cruz afirmou que os Diabo na Cruz representavam o roque (sim rock, mas mesmo lusitano) português. Tal como os Brasileiros haviam arranjado maneiras de reinventar a bossa nova com novas musicalidades, assim se propuseram também os Diabo na Cruz.
Para mim, soou como música estridente, e o brilhante Virou! explodiu, ainda que subrepticiamente, na cena musical portuguesa, e na minh'alma lusitana. Precisávamos de uma banda assim e talvez de muitas outras. Virou! em simultâneo com o combate EP, posteriormente reeditado em formato especial, sabia a tudo, até a pouco. As músicas muito bem, construídas, tinham um ar irreverente, roqueiro, e sobretudo, bem português.
Isso foi o que mais me apelou em Diabo na Cruz, o sentimento de pertença e de identidade que se demarca em toda a sua força e plenitude. As letras são belas, coerentes, e denotam que de facto, o português é uma língua bela e com aptidão musical, capaz de ter uma atitude bem roqueira, sem soar a foleirice. E apesar de apreciar o valor artístico de certos músicos portugueses, há que admitir que o contributo de bandas como os Diabo na Cruz é maior do que o dos rendidos à cultura externa.
E para quem poderia pensar que estava aqui sol de pouca dura, eis que os Diabo na Cruz voltam com Roque Popular, e com uma tarefa tudo menos fácil - igualar Virou!.
A vantagem surpresa, estava à partida ultrapassada, e já com B Fachada fora do barco (para se dedicar aos seus álbuns cada vez mais merdosos e que também já em nada contribuía para a viola braguesa), Roque Popular acabou por se revelar uma pérola, um clássico da nova música portuguesa. Porquê?
Bem, podemos dizer que de facto Jorge Cruz é um tipo que se interessa mesmo pela música portuguesa, e com a colaboração preciosa dos dois Feromona João Gil nas teclas (simplesmente fenomenal), e Bernardo Barata no baixo, as coisas tornam-se mais fáceis. Aliados à bateria omnipresente e plenamente adaptada ao folclore português de João Pinheiro, estão no caminho certo para continuar a cruzada.
A acompanhar a saída de Fachada, para a Viola Braguesa, e para a percussão, foram os recém-chegados Márcio Silva e Manuel Pinheiro, ambos com um currículo respeitável.
Sete Preces, primeiro single de estreia, mostra que os Diabo na Cruz não são bandas para fazer compromissos, nem precisam tão-pouco. A sua música reflecte a sua natureza. E se Sete Preces são uma reflexão sob a natureza portuguesa, já Luzia é uma manifestação da nossa melancolia natural... «Vim às Festas da Sra. da Agonia».
Bomba-Canção é, por sua vez, a abertura  em força do novo disco, o qual já deu lugar ao seu próprio teledisco. Intermitente e poderosa, mais parece a banda sonora de uma feira popular. Já Baile na Eira, associa-se a uma congregação bairrista, e Estrela da Serra uma revisita ao folclore.
Descortinar estas músicas pode ser difícil. Elas imbuem-se no nosso espírito como povo, narra a história de que nós somos, e o reflexo de que vivemos, de uma maneira lírica muito particular. Situação esta que, aliás já acontecia com Virou!. E no seguimento desse mesmo espírito Jorge Cruz e companhia sucedem bem no seu propósito. Agora resta aguardar de ver e ouvir em 3D.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

ZZ TOP - LA FUTURA (2012, AMERICAN RECORDINGS)

De todas as bandas sulistas, os ZZ Top são para mim aqueles que têm maior significado pessoal. Com uma atitude muito simples e directa, eles fundem o blues com o rock da melhor maneira, e sempre com perspectiva muito fronteiriça, quase mexicana, que distanciam-nos um pouco dos red necks puros e duros.
Para além disso são uma banda sólida, com um estatuto lendário, e uma imagem confundível, os ZZ Top podiam encostar-se calmamente, e gozar o resto da reforma ao som La Grange ou Tush (para mim, claro, tem de lá estar Brown Sugar). Sobretudo depois dos depressivos anos 90, em que os grandes dinossauros do passado foram arrecadados, a vaga revivalista de meados dos ano 00 trouxe-os de volta à baila e para o palco principal do rock. No entanto, no que toca a lâminas, nem pensar.....
La Futura, (antecedido pelo EP de aquecimento Texicali) é um álbum muito ortodoxo, e muito clássico no sentido mais apurado do termo. Aliás para quem já vai no seu 15º álbum e com quase 40 anos de carreira, inovar não é pórpriamente o seu lema.
No seu próprio sentido, pode-se dizer que não fogem àquilo que os sempre caracterizou, e definiu, até mesmo na afinação dos instrumentos, particularmente da guitarra... a omnipresente guitarra 
Em primeiro lugar, a capa, mais parece saída de dois rabis e um franciú, que vão passar umas férias ao México, demonstra aquilo que estre trio representa, e o que os faz continuar.... um colectivo bastante coeso.
I Gotsa Get Paid podia ser um álbum directamente extraído The First Album, ou Tres Hombres. Com um riff muito bem construído por Gibbons, ao típico estilo blues rock sulista.
Quando convidado a falar sobre o álbum, Billy Gibbons falou da diferente aproximação imposta por Rick Rubin. Em vez de cada instrumento gravar a sua parte, e a voz por sua vez. Ao invés disso Rubin propôs que os ZZ Top se apresentassem como eles próprios, todos juntos a tocar numa sala, sob uma luz vermelha.
Rubin já tinha travado contacto com Billy Gibbons no passado, mas nunca houve a oportunidade de fazerem uma colaboração efectiva. Quando Rubin disse que queria os velhotes do Texas a trabalhar (como se fossem suas bitches), Gibbons ficou surpreendido com a ideia, e apresentou-os aos outros camaradas.
Volvidos 9 desde Mescalero, os Rangers pareciam estar a precisar de retomar a sua actividade.
Consumption, que já vinha sendo tocada ao vivo há algum tempo, parece disparada directamente do First Album. Tal como Brown Sugar, com um tom funky, mas mais leve, as músicas demonstram exactamente a força e o carisma de Billy Gibbons, com uma voz rouca e preenchida, tipicamente blues, aliada a uma guitarra de sonho. Heartache in Blue, por sua vez, revive o toque da harmonica,
Mas nem só de Blues vivem os ZZ Top, Fly High mostra a faceta mais roqueira dos texanos, que ironicamente fez a sua estreia ao mundo pela mão do astronauta da NASA Mike Fossum, apesar de It's too Easy Mañana se aproximar bem mais do space rock, com o solo fenomenal de Gibbons do que esta.
Em suma La Futura é mais um marco na carreira dos ZZ Top, o símbolo do que eles representam, e sobretudo um reflexo no espelho daquele trio que parece sobreviver ao teste do tempo.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

MÚSICA DO DIA... TEM DIAS#6 WHITE STRIPES - DEATH LETTER
Tenho um respeito crescente e cada vez maior por este grande guitarrista dos nossos tempos. Este homem abusa nas 6 cordas e tem um voz do caraças....
MARK KNOPFLER - PRIVATEERING (2012,MERCURY RECORDS)

Mark Knopfler é daqueles artistas, agora com uma carreira a solo, que nunca se poderá desprender da banda que liderou e lançou para o estrelato, os Dire Stratis. Poder-se-á dizer agora com um sólida carreira a solo, mais vasta e, talvez, igualmente rica à da sua banda, não chega para ultrapassar o nome dos gigantes dos blues dos anos 80, mas coloca-o lado a lado numa digressão europeia conjunta com o colosso americano Bob Dylan, a propósito do seu mais recente lançamento Tempest.
E o título não poderia ser menos sugestivo. Privateering designa o acto de voluntariado ou de recrutamento para um navio particular de auxílio ao Estado em momentos de guerra. Apesar de privado, é um acto de serviço público, uma requisição civil voluntária se quisermos. Hoje poder-se-á ler como juntar-mo-nos a uma banda para demarcar uma posição no mundo à tua volta. Será um apelo às Pussy Riot??!?!!! Para mim, as semelhanças aproximam-se muito àquilo que os Black Keys representam hoje. A começar pela capa de El Camino, com a qual se parece terrivelmente.
Knopfler fez um movimento que poderíamos dizer tanto ousado, como arriscado. Lançar um duplo sobretudo quando a indústria discográfica está em profunda depressão. Mas já percebemos que não são as estratégias de marketing que fazem mover um artista como Knopfler. A sua criatividade frenética, e sobretudo a sua capacidade para lançar faixas icónicas que o puxa adiante, e leva o ouvinte a deambular por uma variedade imensa de estilos musicais.
Apesar de ser uma das lendas do Roque, Mark Knopfler faz aquilo que diríamos ser um passeio pela memória, e sobretudo pelas suas influências, e versatilidade do rock. Podemos assim visitar o folclore celta em Haul Away, um Jazz ambiente em Hot or What, ou Ambiente clássico de Radio City Serenade, ou um Blues do Delta «I Used to Could». Com uma voz cada vez mais amadurecida, há quem o compare a um Leonard Cohen, mas as letras estão longe de ser influenciadas pelo poeta canadiano. Hot or What, por exemplo, mantém viva a sexualidade masculina de Money For Nothing, enquanto Radio City Serenade assemelha-se, por sua vez, muito mais a um estilo Tony Bennett, ideal para uma paisagem nova-iorquina de inverno, com um toque folk.
E é nesta faixa que o tom crítico de Knopfler mais se faz transparecer. Em vez da exuberante vida citadina, Knopfler frisa as vicissitudes, e sobretudo os «senãos» desta vida galanteosa, "You've got to have no credit cards, to know how good it feels", ena mesma senda segue-se «Used to Could», que aborda temas como as adversidades e dificuldades da vida, e em particular o reverso da medalha das crises. E não podemos deixar de pensar em muitas das alegorias igualmente transmitidas pelas metáforas naturais de «Bluebird».
Num aspecto mais técnico, não deixa de ser curioso que, muito embora a guitarra seja a força instrumental, existe igualmente espaço para outros instrumentos brilharem. Seja o piano, ou as gaitas de fole, ou as harmónicas, Knopfler distancia-se da visão de outros congéneres que destaca puramente as 6 cordas.
Em vez disso Knopfler opta por uma visão de canta-autor, que lhe fica definitivamente melhor do que o virtuoso.

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

MÚSICA DO DIA.... TEM DIAS#5: RED FANG - MALVERDE As bandas promovem-se umas às outras, e esta não foi excepçõ. Advinhem lá a que é que isto soa e descobrirão, como a descobri.

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

THE GASLIGHT ANTHEM - HANDWRITTEN (2012, MERCURY RECORDS)

Encarados como promessas de um certo movimento revivalista, e amplamente patrocinados pela Uncut, os Gaslight Anthem apresentam-se como esperanças vazias de um regresso ao vynil e ao rock das massas do passado, com claras reminiscências country.
Herdeiros da música versão Tom Petty, os Gaslight Anthem dão um ar indie, e revivalista ao rock country. Apesar do seu reconhecimento, e a sua veia poética, a qual é subtilmente representada pelo tema «Handwritten». No entanto, bnão os consigo ver para além de uma banda sonora dos liceus americanos (em particular dos estados do interior), onde os jovens, não tão OC, vão deambulando pelos corredores, retirando objectos dos cacifos.
Sinceramente, talvez por que seja eu um estreante, não consigo encontrar tanto encanto na banda do tipo-que-é-capaz-de-ter-relações-familiares com um grande comediante americano. 45 entra-me pelo ouvido como se se tratasse da abertura dos novos filmes da Disney, e então a homónima Handwritten nem se fala, com os habituais coros «wo'oh» que cheiram e destilam a abuso por tantos artistas a longo dos anos.
Apesar de não ser um grande fã, respeito Tom Petty. E ao que parece também Brian Fallon, que até lhe dedicou uma versão da sua música, que surge no final do disco «You got Lucky». Mas se isto é influências, valha-nos Deus. Do criador de Free Fallin', vejo pouco ou nada.
Realmente o que se pode aproveitar de Handwritten é a voz, mas mesmo esta nada tem de original, a não ser restícios dos tempos das vozes esganiçadas e sujas do grunge, o qual reverteu num espírito de rua que os Gaslight Anthem se querem fazer representar. Homens do povo, quase se poderiam chamar. Aliás, apesar de quererem parecer horizontias, e um grupo coeso, sem espaço para individualidades, mas a voz e a guitarra rítmica de Fallon são tãpo omnipresentes, que nem dão espaço para os outros instrumentos respirarem.
A bateria de Benny Horowitz marca compasso, ao passo que o baixo de Alex Levine é completamente abafado pelo som das guitarras. Até mesmo a guitarra de Alex Rosamilia é incapaz de trazer algo de novo. Até porque Handwritten, pode mesmo vir do coração (talvez), mas é talhado para a pop, e isto que se fez já está muito batido.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

CULT - CHOICE OF WEAPON (2012, COOKING VYNIL RECORDS)

No começo do concerto no Hellfest há alguns anos, e após o seu regresso, marcando o fim das desventuras de Ian Astbury nos reformados The Doors, este dizia perante a plateia de metaleiros de que os Cult poderiam estar um pouco des-situados  face ao conceito do festival, pelo facto de não serem uma banda heavy metal. No entanto, uma coisa se seguiu «One thing that's for sure, we like to rock n' roll».
Provavelmente a atitude mais disseminada hoje em dia, e que recebemo-la desde os finais dos anos 50, inícios de 60.
E não é estranho pensar que as bandas que mais continuam a rockar forte e feio, sejam as bandas britânicas. De facto foi do velho continente, particularmente de uma ilha posh que estava ainda a beber e encontrar a sua identidade nos blues amercanos, quando um nigga americano de seattle veio conquistar os antigos donos do mundo. O resultado foi estrondoso, particularmente nos guitarristas desta geração que lentamente começavam a demarcar-se e a encontrar o seu estilo.
As coisas evoluiram, e os Cult continuam a ser uma marca desse legado, e a demonstrar que os velhos continuam a ser bons e a mostrar a muitas bandas novas, para quem o dinheiro representa quase tudo, como é que se compõe o ramalhete. Apesar de serem de uma fase posterior (bem posterior da revolução cultural), directamente saídos dos anos 80 (mas sem sintetizadores, graças a Deus...), os Cult acompanharam a ascensão e declínio de Manchester, apesar de não serem de lá oriundos.
Choice of Weapon é isso mesmo, um regresso às origens. Com um nome a usar uma expressão caricata Weapon of Choice, os Cult invertem as tendências, com um pouco de Sir William Golding no seu pensamento.
Com uma formação renovada e consistente baseada na dupla que continua liderar a banda (Astbury e Duffy), os Cult continuam a demonstrar que são uma banda que não reduz na sua atitude, nem na sua veia artística. E os resultados dessa liberdade e irredutibilidade dão provas de um grande disco, com uma atitude plenamente rocker. Prova disso é a malha infalível de The Wolf, num estilo muito próprio de Billy Duffy, com os arranjos da guitarra a dar mostrar dos seu contínuo emblematismo, muito próximo aliás do seu contemporâneo The Edge, mas mais agressiva claro. Mas isto não se fica aqui, todo o disco é um grande exemplo de excelente trabalho de guitarra, seja no single já lançado - For The Animals - ou mesmo Amnesia ou em Honey From a Knife.
Mas falaramos só das 6 cordas seria redutor. Astbury não é à toa que é um vocalista singular. A sua voz grossa, mas sentida e presente terá, porventura, deixado uma marca para tantos outros vocalistas que se lhe seguiram, Layne Staley é um excelente exemplo disso.
Apesar de estar talhado para as faixas mais agressivas como Lucifer ou A Pale Horse, Astbury dá mostras de uma melancolia profunda e introspectiva, tantas vezes condizente com o grunge como Life >Death, ou Wilderness Now.
E a atitude dos Cult continua lá, muito virada para as raízes e para um certo saudosismo ameríndio, que talvez não seria tão visível no regresso durão de Born Into This. Ao contrário deste último em que os Cult pareciam demonstrar que tinham e sentiam que era seu dever regressar, Choice of Weapon é mais sereno e percorre a sua atmosfera e mitologia, com Astbury a recolher ensinamentos da narração de estórias do seu alma mater dos Doors, Jim Morrison.
Choice of Weapon é, sem dúvida, um dos discos a levar deste ano de crise....